segunda-feira, 28 de novembro de 2016

JUAZEIRO DO MEU TEMPO. FRANCISCO SILVA, FOGUINHO: O PEQUENO GIGANTE - POR JOTA ALCIDES

"Muitos homens devem a grandeza de suas vidas aos obstáculos que tiveram que vencer".Este pensamento do filósofo britânico Charles Haddon Spurgeon, cai como uma luva no personagem agora focado dentro da série Juazeiro do Meu Tempo. Foi uma batalha feroz a sua vida. Desde o nascimento, uma história de superação. Filho de família pobre, nasceu em 04 de novembro de 1944,apresentando sinais de uma das formas mais brandas de nanismo, o chamado nanismo primordial. Segundo a Medicina, é uma forma de nanismo expresso por um tamanho corporal menor em todos os estágios da vida, estatura e peso bem abaixo da média, mas com crescimento proporcional..É preocupante sobretudo nos primeiros dias e meses de vida. Seus pais, Joaquim Cassimiro da Silva e Maria Lindalva da Conceição, tiveram muito trabalho para salvá-lo. Era morre-não morre. Colocaram várias vezes vela nas suas mãos, costume sertanejo nessas horas de aflição, apostando na fé e na esperança. Escapou. Menino, cresceu pouco, ficou pequeno de estatura, mas, felizmente, cresceu sem atrofias, sem anomalias, cresceu proporcionalmente. Aos 14 anos já estava trabalhando como contínuo na Rádio Iracema do Juazeiro. Franzino e baixinho, tinha uma qualidade logo observada pelo diretor da emissora, mestre Coelho Alves: agilidade, super-rápido ao fazer os mandados. Deu-lhe novas funções. a de cobrador e em seguida a de controlista. "Esse menino é fogo", justificou,ressaltando a rapidez do auxiliar como se fosse uma chama, mas teve a imediata correção de sua secretária, dona Irene: "Fogo não, Foguinho". Surgiu assim o apelido de Francisco de Assis Silva, que se tornaria um dos melhores narradores esportivos do Ceará. Esperto, inteligente, disciplinado e otimista, aprendeu a ler e a escrever dentro da própria emissora com a generosa assistência de dona Irene. Era 1958, ano da Copa do Mundo na Suécia. Chefe de Esportes da Rádio Iracema, Dário Maia Coimbra providenciava a transmissão dos jogos pela Rádio Bandeirantes de São Paulo. Foguinho acompanhava tudo com entusiasmo. Segundo Luiz Carlos de Lima, seu amigo e companheiro de muitos anos, Foguinho "vibrava mais com as narrações de Edson Leite e Pedro Luiz do que com as vitorias do Brasil de Pelé e Garrincha". Foi aí que começou a sonhar em ser locutor esportivo. Em 1962, José Boaventura, novo diretor de esportes e comentarista esportivo da Rádio Iracema, decidiu treinar candidatos para locutor esportivo, porque o titular Dalton Medeiros, funcionário do Banco do Brasil, já planejava encerrar a atividade extra de locutor. Increveram-se Foguinho, controlista, e Luiz Carlos de Lima,que já atuava como repórter. Coelho Alves, com sua experiência também de locutor esportivo, e o próprio Dalton Medeiros davam as aulas técnicas e as aulas práticas aconteciam todos os dias com simulação de narração nos treinos de equipes locais no antigo campo da LDJ. Em plena euforia da conquista do Campeonato Mundial pelo Brasil, na Suécia, Foguinho e Luiz Carlos foram aprovados. Foguinho ficou como titular, porque já tinha registro na emissora, e Luiz Carlos como locutor reserva. Em 1965, Foguinho casou com Lúcia Tavares da Silva e deixou Juazeiro contratado pela Emissora Rural de Petrolina, Pernambuco. Com a transferência de Foguinho, Luiz Carlos assumiu como narrador-titular da Rádio Iracema. Já Foguinho, depois de anos de sucesso em Petrolina, foi convidado pela Rádio Cultura da Bahia, ZYN-30, em Salvador, que tinha excelente equipe esportiva, onde se destacavam os comentaristas José Athayde e França Teixeira, este conhecido nacionalmente nos anos 1960 por seu bordão: "É ferro na boneca, minha cara e nobre família baiana" . Na Rádio Cultura, no ar desde 1950 e líder de audiência no Estado, sobretudo com sua "Resenha do Meio Dia", Foguinho transmitiu campeonatos regionais, Brasileirão, Copa do Brasil, Libertadores da América e até a Copa do Mundo. Conforme Luiz Carlos, "foi a fase mais intensa e mais importante de sua carreira". Depois de Lourival Marques, Alceli Sobreira e Carlucio Pereira, era o quarto nome valor-exportação do rádio juazeirense para capitais. Aliás, com seu jeito cativante, Foguinho conseguiu superar muitas dificuldades na conquista de patrocinadores para cobrir como cobriu sete Copas do Mundo: Espanha (1982), México (1886), Itália (1990), Estados Unidos (1994), França (1998), Alemanha (2006) e África do Sul (2010). Em 2014, quando estive no Recife lançando meu 13º livro, "Mestre da Bola no Ar", com a trajetória de sucesso de Luiz Cavalcante, "o comentarista da palavra abalizada", ícone da radiofonia brasileira, dei uma entrevista ao comentarista Ralf de Carvalho, outro dos melhores do Brasil, em seu programa no Rádio Jornal do Commércio.Quando falei do Juazeiro do Meu Tempo, revelou: "Conheci Foguinho em 1998 na Copa da França. Baixinho, magrinho, parecendo um menino, mas excelente narrador e uma figura divertidíssima cheia de histórias e causos. Tiramos umas fotos e ficamos amigos". Eu não tive convivência com Foguinho cheguei à Rádio Progresso do Juazeiro, ele já estava na Emissora Rural de Petrolina, e quando ele voltou para Juazeiro, contratado pela Rádio Progresso, eu já estava trabalhando e estudando no Recife como acadêmico de Jornalismo. Por isso, tive com ele apenas contatos esporádicos durante suas visitas ao Juazeiro., ou depois nas minhas visitas ao Juazeiro. Mas, esses poucos contatos deram-me a percepção exata de que era um cara simples, humilde, honesto, dinâmico, divertido, voluntarioso , determinado, batalhador, alucinado por futebol e e apaixonado pelo radio. "Para ele, um domingo sem futebol era um domingo perdido", lembra o jornalista Demontier Tenório, que trabalhou com Foguinho durante muitos anos e deve ao amigo uma de suas maiores felicidades na carreira: fazer parte do radio esportivo, atuando já há alguns anos como comentarista na radio Vale FM do Juazeiro.. No seu livro "Foguinho Vida e Obra" narrando sua história e suas conquistas, ele ressalta que.as dificuldades enfrentadas na vida eram apenas desafios e não barreiras intransponíveis. Daí, seu agradecimento sempre renovado ao Coelho Alves e ao José Boaventura pela maior alegria que lhe deram na vida colocando-o dentro do rádio. Seu amigo e companheiro de muitas jornadas, Wilton Bezerra, ex-Rádio Progresso, hoje na Rádio Verdes Mares de Fortaleza, nunca esquece uma aventura de superação ao lado de Foguinho: embrenharam-se no meio do mato, em Afogados da Ingazeira, Pernambuco, sob chuva torrencial, trovões e riscos de raios, para consertar uma linha de transmissão danificada pelo aguaceiro e poder irradiar para o Ceará as emoções de um jogo. Em situações como essa, Foguinho surpreendia se divertindo com piadas sobre si mesmo. "Pelo meu tamanho me chamam lenhador de Bonsai"(árvore japonesa em miniaura). Para Foguinho, superar o fácil não tinha mérito, era obrigação; vencer o difícil era glorificante; e ultrapassar o que até então parecia impossivel era esplendoroso. Por isso, com base na sua experiência real de vida,marcada por desafios e superação, sempre confiando na proteção de Deus, Foguinho gostava de encerrar suas transmissões com um bordão de fé e esperança: "Se eu voltar, Deus estará comigo. Se eu não voltar, eu estarei com Deus." Depois de 50 anos dedicados ao rádio esportivo, Foguinho morreu em 15 de julho de 2014. Seu coração parou de bater, mas sua chama não se apagou na memória da radiofonia e da torcida do Cariri. De acordo com o jornalista e historiador Daniel Walker, Foguinho foi "o narrador esportivo juazeirense que alcançou esportivo mundial, sendo detentor do maior número de transmissões esportivas fora do Brasil, incluindo aí jogos disputados pela Seleção Brasileira na Copa do Mundo. Até hoje em Juazeiro ninguém foi mais longe do que ele. E isso não é glória somente para ele, mas também para Juazeiro do Norte, cidade que é um verdadeiro celeiro de celebridades esportivas". Foguinho foi, realmente, um Pequeno Gigante, um Pequeno Notável, que virou um figura lendária da radiofonia carririense. Daria até um filme de Steven Spielberg, cheio de superação, emoção e comoção..

*Jota Alcides, jornalista e escritor, é autor de "PRA-8 O Rádio no Brasil" e "O Recife, Berço Brasílico"-

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