sábado, 4 de junho de 2016

Juazeiro do meu tempo - Anos 60 - Por Jota Alcides

Mesmo morando há 36 anos, desde 1980, em Brasília, onde tive a honra de ser assessor de comunicação do Ministério da Educação e Cultura, Secretário de Redação da Radiobras, Editor-Chefe do Correio Braziliense, um dos mais influentes jornais brasileiros, e Diretor de Fatorama, o primeiro jornal fast-news do Brasil, mantenho comigo, intransferíveis e indeléveis, as emoções vividas nos anos dourados ao final da década de 1960 em Juazeiro do Norte, metrópole progressista do aprazível e exuberante Vale do Cariri. Não foram arrefecidas nem pelas fortes emoções da densa e intensa jornada de uma década antes, entre 1970 e 1980, no Recife, onde fui noticiarista do Rádio Clube de Pernambuco, Editor-Executivo da Rádio Capibaribe do Recife, Editor-Executivo da TV Jornal do Commércio, Editor-Chefe da Rede Globo Nordeste e Diretor de Redação do Jornal do Commércio, um dos mais importantes do Brasil. Tão fortes foram essas emoções dos anos dourados que revisitei Juazeiro do Meu Tempo, nessa semana, sensibilizado pelo falecimento aos 82 anos do jornalista e teatrólogo Aldemir Sobreira, um dos ícones da imprensa do Cariri, ex-diretor de Marketing da TV Verdes Mares. Foi com esses dois mestres que iniciei, simultaneamente, em agosto de 1967, minha carreira no jornalismo: Menezes Barbosa, fundador e diretor da Rádio Progresso do Juazeiro, e Aldemir Sobreira, fundador e diretor do jornal Tribuna do Juazeiro. Curiosamente, recém-chegado de uma temporada de seis anos em Colégio Salesiano de Pernambuco, fui apresentado aos dois pelo mesmo jornalista: Carlúcio Pereira, então um dos mais famosos nomes da radiofonia caririense, âncora do "Rádio-Revista do Meio-Dia", líder de audiência na Rádio Progresso. Menezes Barbosa, conheci-o em seu escritório na Rádio Progresso, 1º andar do Edifício Walquíria, na rua Santa Luzia, centro; Aldemir Sobreira, conheci-o na entrada do edifício comercial "A Vencedora", o mais alto da cidade na Rua São Pedro, empreendimento de Severino Alves Sobrinho, no chamado "Quarteirão de sucesso da cidade". Eu tinha grande admiração pelo jornalismo no rádio ao qual dediquei-me de alma inteira, mas minha verdadeira obsessão era o jornal. "Jornalismo é uma atividade que dá mais prestígio do que dinheiro, porém é a mais bonita das profissões", dizia-me Aldemir Sobreira, alertando e  estimulando. Com ele, desbravei os primeiros caminhos do jornalismo impresso: redigia uma coluna semanal assinada, fazia revisão de alguns textos que ele me submetia, acompanhava-o na impressão do jornal na Tipografia Cariri, em Crato, e ajudava-o, numa kombi, na distribuição dos exemplares no Juazeiro. Com sede na Avenida Padre Cícero, mais ou menos perto do cruzamento com a rua Santa Luzia, o jornal exercia influência com a credibilidade de porta-voz dos anseios juazeirenses. Casado com a professora de Literatura, Maria dos Remédios, e apoiado no jornal pela irmã, também professora de Literatura, Sílmia Sobreira, o tribuneiro Aldemir Sobreira era uma referência intelectual da cidade, uma personalidade sempre requisitada e sempre presente nos principais eventos do Juazeiro. Cidadão sério e brincalhão, culto e dinâmico, foi Secretário da Cultura e um dos principais colaboradores do então prefeito Mauro Sampaio, o melhor da história do Juazeiro depois do Padre Cícero. Com sua inteligência criadora, Aldemir estava sempre desafiando a capacidade realizadora de Mauro Sampaio com sugestões palpitantes e propostas inovadoras para uma cidade em organização e crescimento. Em evidência, tornei-me Assessor de Imprensa do prefeito Mauro Sampaio. Nesse Juazeiro do Meu Tempo, ao lado de Aldemir Sobreira, brilhavam outros ícones da mídia e demais segmentos da sociedade, todos movidos pelo mesmo sentimento de servir, contaminados então pelo idealismo dos membros da Câmara Júnior, do Rotary Clube e do Lions Clube, entidades realmente proativas na vanguarda da prosperidade do Juazeiro. Com saudades lembro de alguns deles: Coelho Alves, ou mestre Coelho, como era carinhosamente chamado, diretor-gerente da Rádio Iracema do Juazeiro, a voz mais conhecida do Cariri, primorosa e inconfundível, admirada e celebrada como "uma voz amiga dentro do seu lar"; Seu irmão, Geraldo Alves, audiência cativa nas manhãs do Juazeiro, também pela Radio Iracema, com seu programa "Discoteca do Fã"; Alceli Sobreira, além do vozeirão incomparável, excelente repórter aprimorado por sua experiência na Rádio Piratininga de São Paulo; . Souza Menezes, culto e versátil, era excelente cronista da Rádio Iraccema, com reflexões diárias sobre a realidade juazeirense. Outro cronista bastante apreciado na Rádio Iracema era Expedito Cornélio, eficiente presidente da Celca-Companhia de Eletricidade do Cariri, pioneira da energia de Paulo Afonso no Ceará. Na Rádio Progresso, o cronista Menezes Barbosa, o mais aplaudido do Cariri, empolgava multidões em mobilizações e campanhas comunitárias, espalhando solidariedade e conforto aos mais carentes ou eventuais necessitados. Daniel Walker, redator e um dos apresentadores do Jornal Sonoro Iracema, atuava também como correspondente do jornal O Povo, de Fortaleza, onde fazia Juazeiro aparecer em destaque. Eu, além de acumular sucesso e prestígio na região como produtor e editor do "Repórter Cariri", apresentado pela voz poderosa de Geraldo Batista na Rádio Progresso, projetava Juazeiro para todo o Brasil nas páginas do velho Diário de Pernambuco, o mais antigo jornal em circulação na América Latina, desde 1825. Era seu correspondente no Cariri. Foi tão importante esse espaço que o tradicional jornal de Pernambuco acabou abrindo e mantendo aos domingos uma coluna por mim assinada intitulada "Diário no Cariri". Walter Barbosa, dono de grande audiência com "Delegacia das Lamentações" na Rádio Progresso e correspondente do Correio do Ceará, de Fortaleza, estava sempre batalhando, incansavelmente, em defesa da imprensa do Juazeiro cuidando de projetos e interesses da Associação Juazeirense de Imprensa; Wellington Amorim, cronista esportivo, o maior vibrador por Juazeiro, a cada conquista da cidade fazia sua comemoração pessoal, friccionando as mãos e louvando Padre Cícero: "O homem é mesmo forte". Aguinaldo Carlos, ícone da jovem-guarda no rádio, e futuro advogado, era uma referência creditícia no Banco da Bahia agência do Juazeiro; Dário Maia Coimbra exibia dia e noite a cara do CRP-Centro Regional de Publicidade, pioneiro na difusão de notícias no Juazeiro; Renato Casimiro despontava como grande pesquisador da história do Juazeiro; Abraão Batista, professor universitário, fazia Juazeiro brilhar na literatura de cordel; Jose Carlos Pimentel, também futuro advogado, era atração na Radio Progresso com os flagrantes sociais juazeirenses; Pedro Bandeira, consagrava-se pelo rádio como Príncipe dos Poetas Populares num Juazeiro cheio de violas e violeiros; Juazeiro parava todos os dias à tarde para ouvir "A Tarrrrrrrrrde é Nossa", com Campos Júnior; Outra grande atração era João Sobreira, operador da Varig no Aeroporto do Juazeiro, agitando a "Juventude Brasa" nas manhãs da Radio Progresso; João Barbosa, gerente comercial da Rádio Progresso, de espírito bem humorado, tinha um método particular de estimular os mais jovens duvidando de suas ousadias: "Isso não vai dar certo!". Todos nós trabalhávamos com muita dedicação e amor. Ganhávamos pouco, o salário às vezes não dava nem para pagar a conta mensal no Jaçanã Lanches, do amigo José Lima, no térreo do Edificio M. Oliveira, em frente às emissoras. Mas éramos felizes. Juazeiro do Meu Tempo ainda não tinha Estatua do Padre Cícero, nem Estádio Romeirão, nem Memorial Padre Cícero, nem Ginásio Poliesportivo, nem Centro de Apoio aos Romeiros, nem Luzeiro do Nordeste, nem Shopping Center, nem hipermercado, nem supermercado, nem televisão, nem grandes hotéis e também ainda não tinha curso superior. Mas o que seu povo ouvia o dia inteiro nas ondas do rádio era uma mensagem de franco otimismo, plena autoconfiança e crença no progresso: "Cidade que mais cresce no Ceará". Vislumbrava-se um futuro bem próximo onde apareciam, materializados, todos esses sonhos. E era uma coisa tão profética que hoje Juazeiro surpreende o Ceará com excelente rede hoteleira, hipermercado, três supermercados atacarejos, dois shopping centers, duas estações de televisão e mais de 150 cursos superiores, o maior centro universitário do interior do Estado. Nesse Juazeiro do Meu Tempo, divertíamos nas festas dançantes do Clube dos Doze, do Treze Atlético Juazeirense, nos shows artísticos na Quadra João Cornélio e na Churrascaria Acapulco ou ainda com os mais recentes filmes internacionais nos Cines Eldorado e Capitólio. Fora da imprensa, mas sempre ao lado da imprensa, destacavam-se importantes líderes comunitários e formadores de opinião: Padre Murilo Barreto, estimadíssimo vigário do Juazeiro, era um intelectual, radialista por segunda vocação, querido e respeitado por todos; José Gondim Lóssio, presidente da Associação Comercial do Juazeiro, sempre à frente de grandes empreendimentos; Aderson Borges de Carvalho, um dos maiores empreendedores do comércio do Juazeiro; José Afonso de Oliveira, diretor do Banco do Juazeiro, orgulho da cidade; Gilberto Sobreira alimentava a cultura do Juazeiro com a Gráfica Sobreira. Antonio Fernandes Coimbra fazia o mesmo com a Gráfica Mascote. Francisco Souza (Tico) tornava Juazeiro conhecido fora do Cariri por sua Cajuina São Geraldo, o melhor refrigerante de caju do Brasil.Geová Sobreira, diligente e obstinado diretor do Ginásio 24 de Março, que ele criou contra a vontade do Governo do Ceará que impedia Juazeiro de ter ensino ginasial. Que luta hein Geová!; Engenheiro eletrônico José Batista, formado pela Universidade Federal de Pernambuco, dava orgulho ao Juazeiro com sua IESA-Indústrias Eletromáquinas S/A, na Avenida Padre Cícero, uma fábrica de rádios para todo o Brasil. Sim, Juazeiro tinha uma fábrica de rádios. Dinâmico e entusiasmado Antonio Celestino conduzia o sucesso da Aliança de Ouro S/A, referência comercial do Juazeiro. Feijó de Sá comandava a organização Icasa-Indústria e Comércio de Algodão S/A, a nova força econômica da cidade; e Severino Gonçalves Duarte com a Imboplasa-Industria de Borrrachas e Plásticos S/A abria o florescente polo de calçados do Juazeiro, que se tornaria o terceiro maior do Brasil. Em Juazeiro do Meu Tempo e do tempo de Aldemir Sobreira, nas tardes ensolaradas de domingo, juntava-me aos companheiros de jornadas esportivas, num clima de harmonia e de confraternização, no antigo e acanhado estádio da LDJ-Liga Desportiva Juazeirense, sobretudo no tradicional clássico Icasa X Guarani. O espetáculo no radio era com eles: Wellington Amorim, Jucier Cunha, Wellington Balbino, Francisco Silva (Foguinho), Dalton Medeiros, Wilton Bezerra, José Boaventura, Luiz Carlos de Lima, Carlos Alencar, Jucier Lima, Cícero Antonio, Paulo Duarte, João Eudes e outros craques da bola no rádio. Ocupavam também essa galeria radiofônica: Robledo Pontes, Pedro Duarte, Vilmar Lima, Erivan Xavier, Albis Filho, Estevão Rodrigues, Donizeti Sobreira, Lucier Menezes, Maciel Silva, Roterdam Martins, Wellnigton Oliveira, Francisco Ferreira (Escurinho). Embora fizessem parte de emissoras concorrentes e competitivas, não se revelavam rivais. Pelo contrário, o objetivo de cada um era o objetivo de todos: servir ao progresso do Juazeiro. Éramos mais do que colegas, mais do que companheiros, éramos literalmente confrades. Formávamos uma confraria. Graças a Deus fiz parte dessa geração, preciosamente rica em criatividade e, realização. propulsora do progresso do Juazeiro, cheia de patriotismo por Juazeiro. Convivi prazerosamente com todos esses ativistas pró-Juazeiro. Nossos ídolos eram os Beatles de Liverpool e os astros brasileiros da jovem-guarda. Vivíamos o dia inteiro em ritmo de iê-iê-iê, numa contagiante revolução da alegria. Assim era Juazeiro do Meu Tempo e do tempo de Aldemir Sobreira nos incríveis e inesquecíveis anos dourados que não voltam mais. Como era bom!....Agora, só ouço o poeta francês Henry Bataille me confortando: "O passado é um segundo coração que bate dentro de nós".

*Jota Alcides, jornalista e escritor, é autor de "Juazeiro, Cidade Gloriosa" e "Santa Maria do Juazeiro" "

2 comentários:

  1. Grande J. Alcides. Fiel e emocionante relato de uma época de nossa Juazeiro do Norte que tivemos a sorte de desfrutar. Razão tem o bamba, Elton Medeiros: "Quem não tem passado é fantasma de si próprio". Wilton Bezerra.

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  2. Que lindo e encantador texto sobre meus tios Aldemir e Alceli...nossa família ainda sente muito a morte desses mestres que nos deixaram grandes lições e um amor pra toda a vida: o jornalismo!

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