segunda-feira, 21 de novembro de 2016

JUAZEIRO DO MEU TEMPO: CHEGADA DA TELEVISÃO -POR JOTA ALCIDES

Foto  TV Jornal-Recife - Anos 60

Desde que deixou de pertencer a Pernambuco passando a fazer parte da geografia do Ceará, em 1799, até anos finais da década de 1960, portanto 161 anos, o Cariri sobreviveu praticamente abandonado pelos seguidos Governos do Ceará e Juazeiro, além de abandonado, perseguido pelos Governos do Estado, pela Igreja Católica e pela mídia de Fortaleza. por causa dp chamado Milagre da Hóstia em 1889. Culpa do segundo bispo do Ceará,autoritário e arbitrário Joaquim Vieira. Suas diabólicas cartas pastorais, cheias de mentiras, injúrias e calúnias, condenando veementemene Juazeiro, Padre Cícero, Beata Maria de Araújo e o propalado milagre, lidas nas missas de domingo em todas as igrejas do Ceará, criaram no Governo do Estado, na Igreja toda e na mídia,um espírito belicoso contra Juazeiro.Até uma guerra houve em 1914, promovida pelo governador Franco Rabelo que mandou 1 mil militares armados ao Cariri para destruir Juazeiro e matar Padre Cícero. Com a reação de milhares de romeiros do Nordeste, o governador perdeu a guerra e foi deposto. Desde então, o Ceará é indisposto com Juazeiro. Governos entram e saem e nada fazem por Juazeiro. Talvez as únicas exceções tenham sido o Governador Virgilio Távora, que ajudou um pouco o prefeito Humberto Bezerra e o Governador Plácido Castelo, que ajudou um pouco o prefeito Mauro Sampaio. Dos mais recentes, entretanto, Ciro Gomes e Cid Gomes foram uma tragédia. Agiram como verdadeiros inimigos do Juazeiro. Fizeram obras com aparência de bemfeitorias para enganar Juazeiro, mas que, na verdade, são malfeitorias, como o Metrô do Cariri e o Hospital Regional, incompatíveis com as reais necessidades juazeirenses. Até o Juazeiro do Meu Tempo, o resultado dessa omissão e dessa discriminação contra Juazeiro era bastante visível, inclusive nas vias de comunicação. Ligação rodoviária Juazeiro-Fortaleza era feita pela empresa Expresso de Luxo, de expresso e de luxo só no nome, por estrada de barro cheia de buracos e poeirenta, enquanto a ligação rodoviária Juazeiro-Recife era feita pela Auto Viação Princesa do Agreste, em dois ônibus diários, um de dia e outro à noite, por asfalto até o Recife. Na falta ainda de uma Estação Rodoviária, só inaugurada em 1972, os ônibus interestaduais faziam terminal de embarque e desembarque junto aos escritórios de suas agências. O da Princesa do Agreste ficava na Rua São Francisco, em frente à Praça Padre Cícero. Como reação ao desprezo de Fortaleza, Juazeiro passou a ter um intenso trafego econômico e cultural com Recife. O ônibus para o Recife saia de Crato com dois ou três passageiros e quando chegava no Juazeiro enchia. O que saia do Recife para o terminal de Crato, quando chegava no Juazeiro esvaziava e nele ficavam doisou três passageiros para Crato. Juazeiro liderava o relacionamento do Cariri com Recife. Isso pesou na hora de implantação de outra via de comunicação,: a televisão. Nessa época, o radio de Fortaleza chegava com precariedade ao Cariri. As duas únicas emissoras de ondas curtas da capital, Ceará Rádio Clube e Rádio Dragão do Mar não conseguiam ter boa recepção no Juazeiro, mas as duas maiores emissoras do Recife, Radio Jornal do Commércio, Pernambuco falando para o Mundo, e Rádio Clube dePernambuco, emissora pioneira na América Latina, chegavam ao Juazeiro estourando, com som local.Ambas tinham grande audiência no Juazeiro, sobretudo dos programas esportivos. O Ceará já tinha televisão, mas não demonstrava o menor interesse em estender seu sinal até Juazeiro onde chegava com as imagens fantasmas caindo ou então "chuviscando", uma porcaria. Depois de várias experiências técnicas em 1965, iniciadas pelos entusiasmados juazeirenses Luiz Casimiro e Luiz de França, finalmente ao final desse ano, sob a orientação do técnico pernambucano Geraldo Aureliano, foi instalada no topo da colina do Horto, com apoio do prefeito Humberto Bezerra, uma torre repetidora da TV Jornal do Commércio, do Recife. Foi recebida com vibração pelo povo do Juazeiro, mas o povo do vizinho Crato não gostou porque, via repetidora, tecnicamente, a televisão do Recife atingiria somente Juazeiro, Barbalha, Missão Velha, Brejo Santo e Caririaçu, não beneficiando Crato que, tecnicamente, teria de ter sua própria repetidora. Então a maior e mais moderna televisão do Brasil, com seu edifício de acabamento em mármore, granito, cerâmica e esquadrias de alumínio, o Canal 2 do Recife tinha uma torre de 138 metros de altura, equipamentos todos importados da Europa, três estúdios e um auditório para 460 pessoas. Empreendimento mais do que arrojado para a época, A TV Jornal do Commércio nasceu assim grandiosa suplantando as grandes televisões que já existiam no Sul (Tupi, Record ). Produzia a sua própria programação, incluindo novelas. Juazeiro adorava ver os programas de auditório do Canal 2 do Recife sempre com muito luxo, desde os cenários às roupas dos artistas e do público, tudo cercado do maior glamour. E assim a televisão chegou ao Juazeiro. Como havia pouquíssimos televisores nas residências do Juazeiro, nas principais lojas comerciais da Rua São Pedro, no centro, como Aliança de Ouro, Armazém Feijó, Simpatia, Casa Alencar, Centro Elétrico, eles ficavam ligados até tarde da noite quando o sinal era bem melhor do que à tarde. Juazeiro passou a ver os mesmos programas de grande audiência vistos pelo Recife na TV Jornal do Commércio. Os mais famosos deles, "Você Faz o Show", com Fernando Castelão, show de variedades aos domingos à noite, Bossa 2, sob o comando de José Maria, programa essencialmente musical sobretudo de Jovem Guarda, domingos à tarde, e "Noite de Black Tie", com Luis Geraldo, show de arte, cultura e elegância da sociedade pernambucana, sábados à noite.Os juazeirenses ficavam fascinados por "Noite de Black Tie" pelo espetáculo de moda, arte e sofisticação simbolizando a força do Recife como centro do poder econômico e cultural do Nordeste brasileiro. Parecia uma festa de gala O próprio dono da emissora, empresário e senador F. Pessoa de Queiroz fazia questão de assistir e aplaudir o programa na primeira fila do auditório. Eu pessoalmente gostava de ver, no Juazeiro, o "Repórter Esso", com Édson de Almeida, e "Show de Notícias" com sete apresentadores (cinco homens e duas mulheres) exibindo um jornal abrangente, versátil e competitivo durante 25 minutos Fazia parte desse show, um desenhista que produzia caricaturas dos entrevistados enquanto eles davam entrevistas. Com isso, aumentou ainda mais o fascínio e a influência do Recife sobre Juazeiro que permanecem até os dias de hoje. Curiosamente, no , mercado de profissionais de saúde no Juazeiro, os anúncios publicitários radiofônicos de médicos com seus consultórios e clínicas, em sua maioria, trazem a especialidade de atendimento de cada um com essa informação adicional: "Formado pela Universidade Federal de Pernambuco". É uma indicação que, além de revelar o diferencial de valor de Pernambuco sobre o Ceará, funciona como selo de garantia de qualidade que simboliza a importância do Recife no conceito dos juazeirenses fortalecendo e ampliando o relacionamento entre as duas cidades que são ligadas atualmente por três vôos diários diretos. Ainda nesse quesito médico, inexistem anúncios radiofônicos semelhantes de médicos formados pela Universidade Federal do Ceará, certamente porque não agregam valor no julgamento da gente do Juazeiro. Pelos estudos existentes sobre a influência dos macropolos metropolitanos, nas diversas regiões do Brasil, São Paulo é o macropolo nacional do Juazeiro, pois é a metrópole com quem Juazeiro mantém o maior tráfego comercial exigindo também vôos diretos diários entre as duas cidades. Mas, o macropolo regional do Juazeiro é o Recife e não Fortaleza, que é apenas capital política e administrativa vista com restrições pois não dedica a devida atenção ao Juazeiro. Com dois canais de televisão hoje,TV Verde Vale e TV Verdes Mares-Cariri, Juazeiro não precisa mais da televisão do Recife. Mas, quando Juazeiro quer novidades na economia, na cultura, na educação, na ciência na tecnologia e no turismo corre para o Recife. E vai continuar sendo assim até o dia em que o Governo do Ceará, a Igreja Católica e a mídia de Fortaleza abandonarem a cartilha do famigerado e truculento bispo Joaquim Vieira, que infernizou a vida do Padre Cícero junto ao Vaticano, encerrarem a odiosa discriminação e passarem a dar ao Juazeiro o tratamento que merece como Cidade que mais cresce no Ceará e Metrópole do Cariri. Como não tem do Ceará o que merece, mesmo após 217 anos de separação do Cariri de Pernambuco, Juazeiro permanece com o espírito pernambucano, o espírito altivo de Leão do Norte, e atraído pelo glamour da bela Veneza Americana..

*Jota Alcides, jornalista e escritor, é autor de "PRA-8 O Rádio no Brasil" e "O Recife, Berço Brasílico"-

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