"São Paulo tem cinco estações: Primavera, Verão, Outono, Inverno e Piratininga. Você está ouvindo a PRB-6, Rádio Piratininga, emissora do coração de São Paulo". Com seu vozeirão inconfundível, grave e de alta potência, fenômeno sonoro como um trovão, assim ele anunciava o prefixo da Rádio Piratininga de São Paulo encantando os ouvintes da maior metrópole da América do Sul. Seu nome: Alceli Sobreira, radialista, jornalista, noticiarista, humorista, cronista, disck-jóquei, radioator, animador de auditório, escritor, poeta, professor, poliglota, mestre de cerimônias, autêntico showman. Depois de Lourival Marques,exportado do Juazeiro para a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, no final dos anos 1940, foi o segundo radialista do Juazeiro de qualidade exportação, brilhando num grande centro, no competitivo mercado de São Paulo. Contratado como locutor e jornalista, pela Piratininga, sucessora da Rádio Cruzeiro do Sul, fundada em 1927, exerceu as funções de locutor, noticiarista, secretário de Redação e Redator-Chefe da emissora. A Rádio Piratininga primava pela excelência, segundo depoimento do próprio Alceli: "Foi uma época maravilhosa, onde tive a oportunidade de ampliar os meus conhecimentos jornalísticos em todos os aspectos",Trabalhou também na Rádio Eldorado de São Paulo. Poderia ter-se consagrado nacionalmente como um dos maiores radialistas do Brasil, mas por motivos familiares teve que voltar para sua terra, Juazeiro. Sobre essas mudanças em sua vida, um dia escreveu: "Sonhar não é o bastante. Bom mesmo é trabalhar sempre para ser o melhor. Ser o melhor não é o bastante. Bom mesmo é pensar no amanhã. Ter fé no amanhã não é o bastante. Bom mesmo é ser humilde com os menos favorecidos e ter altivez com os grandes". Foi no Juazeiro que começou sua carreira, em 1952, no Centro Regional de Publicidade (CRP), escolinha de todos, ou quase todos os radialistas da cidade. Deram-lhe oportunidade os então diretores: Dário Maia Coimbra (Darim) e João Menezes Barbosa. Em 1954 ingressou na Rádio Iracema de Juazeiro, estimulado pelo seu amigo Edésio Oliveira e pelo diretor artístico Expedito Cornélio. Na emissora pioneira do Juazeiro, polivalene e versátil, Alceli fez de tudo: locução comercial, rádio-teatro, diskc-jókey, humorismo, rádiojomalismo e animação de auditório, escrevendo e produzindo os mais variados programas..No início dos anos 1960, resolveu se aventurar no mercado de São Paulo. Brilhou na Rádio Piratininga e na Rádio Eldorado de São Paulo, mas teve que voltar logo ao Juazeiro, por razões familiares, e retomou suas atividades na Rádio Iracema do Juazeiro. Um dos programas de sucesso de Alceli Sobreira na Rádio Iracema, foi Coluna da Hora que apresentou com Assis Ferreira (Escurinho), formando a dupla Xexéu e Cajarana. Era um programa humorístico ,de segunda à sexta-feira, ao meio dia, criticando ou elogiando, quando preciso, as ações da administração municipal e também de outras instituições públicas. Ele próprio chegou a relatar: "Eram textos elaborados de acordo com cartas que recebíamos da população, principalmente, de pessoas residentes nos bairros da periferia, referindo-se às dificuldades de cada localidade. Um dos prefeitos da época costumava dizer que Eu (interpretando Xexéu) e Escurinho, fazendo o Cajarana, éramos fiscais da prefeitura, porque mostrávamos os problemas existentes na cidade e, ao mesmo tempo, apresentávamos sugestões, para solucioná-los". Com esse programa ganhou imensa popularidade. Outro programa seu de grande audiência no Juazeiro do Meu Tempo, final dos anos 1960, foi "Parada da Jovem-Guarda" ,toda as tardes,que tinha como trilha sonora "Escreva uma carta meu amor", sucesso de Roberto Carlos. Formado em Contabilidade pela Escola Técnica do Comércio do Juazeiro, fez um pequeno intervalo em sua carreira artística para se dedicar à gestão pública municipal do Juazeiro, assumindo, em 1977, o cargo de Assessor de Imprensa do Prefeito Ailton Gomes e, em seguida, o cargo de Secretário de Finanças do Município. Em 1984, com a morte do Mestre Coelho Alves, assumiu a direção da Rádio Iracema do Juazeiro. Seu último trabalho em rádio foi como Redator-Chefe da Rádio Vale do Cariri,mais potente emissora do Juazeiro. Além das emissoras do Juazeiro e de São Paulo, Alceli Sobreira atuou também na Rádio Difusora de Cajazeiras(PB) e na Rádio Tupinambá de Sobral(CE). Fora do rádio, foi, durante muitos anos, professor de inglês do Colégio Salesiano do Juazeiro e da Escola Técnica do Comércio do Juazeiro. Escreveu os livros, "Folhas ao Vento" e "Breve História da Radiofonia". No caso da radiofonia, Alceli tinha consciência precisa quanto ao papel do radialista que assim definiu em artigo publicado no Diário do Nordeste: "É a ele que cabe a tarefa de bem informar, de divertir, de promover o entrosamento de toda a comunidade, de orientá-la através de um cuidadoso programa de utilidade pública, de promover também a expansão da cultura por intermédio de sua divulgação freqüente, de dirimir dúvidas do ouvinte, e afinal, com tudo isso dando seu entusiástico e imprescindível contributo ao desenvolvimento e progresso de sua terra!". Embora tivesse grande prestigio e elevada popularidade, Alceli Sobreira tinha como marcas de sua personalidade a simplicidade e a humildade. Despojado, vestia-se como lhe convinha, sem ligar para regras, estilos ou padrões de moda. Raramente aparecia de palitó e gravata (preferia o modelo borboleta), somente em solenidades ou cerimônias especiais. Vestia-se modestamente. Mas no comando de programas de auditório, como "A Cidade se Diverte" abria exceção e aparecia com roupas mais ousadas, ternos de estampas quadriculadas ou xadrêz em cores chamativas, talvez com a intenção de passar e gerar alegria. Para alguns, eram roupas extravagantes, mas, na verdade, Alceli adotava a padronagem de moda do príncipe de Gales Albert Edward (1841-1910), Rei Eduardo VII da Grã-Bretanha , que era muito elogiado por sua elegância. .Alceli calçava modestamente. Flagrei-o diversas vezes, chegando ao trabalho na Rádio Iracema, de sandálias japonesas, como se fosse a coisa mais normal do mundo. Para ele, mais importante do que vestir ou calçar de acordo com a moda, era fazer bem o que sabia fazer, no mais elevado nível de profissionalismo. Aos companheiros mais jovens, quando procurado, sempre tinha um aconselhamento de técnica e de ética no rádio baseado em sua longa experiência. "Quando desejares um pouco de alento, em momentos de incertezas e indecisão que te possam causar mal, por menor que seja, pensa em mim, que te mostrarei o norte para que saibas o caminho a seguir", escreveu. Culto e dono de extrema sensibilidade humana e artística, Alceli tinha o hábito da leitura de grandes autores, elegendo, entre os preferidos, a escritora ucraniana-pernambucana, Clarice Lispector, de quem cultivava esse pensamento como uma jóia da literatura: "A felicidade aparece para aqueles que choram. Para aqueles que se machucam. Para aqueles que buscam e tentam sempre. E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas". Depois de mais de 55 anos de atividades radiofônicas, Alceli Sobreira morreu em 2009, sem ter anunciado o que muitos juazeirenses gostariam de ter ouvido no vozeirão dele imitando a lendária PRB-6 de São Paulo: "Juazeiro tem cinco estações; Primavera, Verão, Outono, Inverno e Iracema. Você está ouvindo a ZYH 21, Rádio Iracema, emissora do coração do Juazeiro".Foi-se como viveu, poetando: "Meus versos são compostos de forma direta.Frutos duma inspiração que em meu peito arde.Enfim, louvo ao meu Senhor que me fez poeta!.." Alceli Sobreira lembra muito o poeta pernambucano e meu amigo Mauro Mota(1911-1984) , jornalista, professor, cronista, ensaísta e memorialista dos melhores do Brasil, que foi Diretor de Redação do Diário de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Letras. Comparável na sua simplicidade e na sua poesia de fundo simbólico, focando dramas humanos do cotidiano em linguagem natural e coloquial.Grande Alceli Sobreira, um radialista completo, poeta, professor, poliglota, seguro, versátil, ícone da radiofonia caririense com seu vozeirão poderoso e tonitruante, o trovão nas ondas do rádio.!
*Jota Alcides, jornalista e escritor, é autor de "Padre Cícero, O poder de Comunicação" e "Comunicação & Linguagem das Massas"-
Alceli Spbreira grande locutor foi meu colega da Radio Piratininga de Sao Paulo onde eu participava junto com Vicente Lia da Radionovela Juvencio o Justiceiro do Sertao. Saudades daquele velho e bom tempo do Radio
ResponderExcluirAdalberto Dantas